no âmbito assim da vida, por exemplo, vejo-me vezes demais em situações novas e invariavelmente indesejadas, as últimas centenas das quais decorrentes de uma decisão do tribunal que obrigou o estado a reparar uma situação nova e indesejada em que me meteu e que me causou um dolo do caralho.
ora o estado, por definição, é aquilo que todos sabemos. e desta vez enfiou-me numa sala com professores de música de um mestrado qualquer daqueles dos bons.
as minhas orelhas nunca foram boas para a música e a sala tinha um piano. todos se conheciam e eram muito simpáticos e cúmplices. e eu derivado à hora, às cassetes do doutor phil e à longa viagem que o estado me obrigou a fazer para me compensar, resolvi meter conversa com o professor de música que me parecia possuir o transtorno de personalidade menos agravado e os decibéis mais próximos daquilo a que poderíamos denominar nível de não agressão.
a conversa foi exactamente assim, que eu só cheguei a casa há vinte minutos:
- então vocês costumam tocar aqui neste piano?
- não, neste não por causa da tranca.
- ah, vocês não podem tocar em pianos de cauda?
- não, pá. tranca é aquela fechadura que não deixa abrir a parte das teclas.
e olhou para mim como se eu estivesse a comer um gelado com a testa.
a minha erudição musical só vai até ao waldo de los rios. explicar que me passou pela cabeça que esta malta da música pudesse ter um jargão para a cauda do piano, fosse ele tranca ou peida ou outra merda qualquer era assumir definitivamente que o estado me anda a compensar através da surrealidade e da auto-humilhação. e eu posso estar já tão desorientado como o josef k mas para já não me vou metaforsear em insecto.
sofri bastante bullying psicológico até ao fim da sessão.
uma tranca de um piano, na realidade a que chamo minha.