com jeitinho isto pode ficar como aquele filme porreiro do nicolau breyner aos tiros no faraó.
troquei os vossos nomes por "indivíduo" porque, parecendo que não, já apareceram aqui 841 gajos no site e embora 500 sejam eu, pode andar por aí também o vizinho de alguém.
mas acho que por indivíduo ele não vai lá.
tentei ser como o bom alfaiate e cingir-me aos fatos. não faço figuras de estilo.
20.00 - Encontro-me com um indivíduo e vou pôr gasolina para partir para Lisboa. Quando paro na bomba, abre a carteira, conta os trocos e cala-se.
20.23 - Páro na portagem. o indivíduo ao meu lado abre a carteira, conta os trocos e fica a ver-me a pagar à senhora.
20.41 - Encontramo-nos com outro indivíduo em Benfica. tem uma camisa às riscas verdes, azuis e côr de rosa. pede-nos 5 minutos para ir a casa.
20.52 - O indivíduo regressa com uma camisa às riscas verdes, azuis e violeta. parece que traz mais um pouco de gel. apanhamos um táxi. o motorista sugere-nos um caminho mais rápido.
21.08 - o motorista pede-nos desculpa pela fila, que nunca tinha visto uma assim àquela hora.
21.12 - o táxi chega. um indivíduo abre a carteira, conta os trocos, e fica a ver outro a pagar.
21.13 - Chegada ao restaurante. ao todo, 5 indivíduos e um frequentador de festas da ilga.
21.15 - Estão 40º no restaurante e a empregada avisa que não há cerveja. perante a indignação geral, explica que aquele é um restaurante com conceito. ficamos todos mais aliviados. para nos apropriarmos melhor do conceito, senta-nos em sofás de flanela debaixo de lâmpadas a ferver.
21.16 - Um indivíduo assusta-se, aparentemente por só agora perceber que estava num restaurante com conceito. Mexe na carteira, conta os trocos e senta-se, nervoso.
21.18 - Um indivíduo responde , a cada palavra da empregada, com "hã? ai sim?". depois sorri muito e pisca-lhe o olho.
21.30 - A mesa do lado canta, em côro, um êxito do luís represas.
21.34 - A prova provada de que a libertação de timor não foi por acaso. outra mesa acompanha a primeira e ficamos todos a saber que os poetas são altos.
21.37 - Apercebemo-nos que servir com metade do cú à mostra faz parte do conceito. um indivíduo fica muito contente com esta nova dimensão do conceito. chama muitas vezes a empregada, responde com "hã? ai sim?". depois sorri muito, pisca-lhe o olho e abre as pernas.
21.43 - Servem-se as entradas especiais da casa. Eram pão com várias coisas.
22.14 - Chegada ao restaurante de um 6º indivíduo. Com o adepto da ilga éramos agora sete. continua a faltar um.
22.17 - o indivíduo que chegou atrasado comunica que tem de beber menos porque está de prevenção até à meia-noite. acho que era bombeiro.
22.30 - Chegam os pratos. o conceito não era lá muito generoso nas doses. pede-se mais uma garrafa de alvarinho.
22.34 - A mesa do lado canta, em côro, um êxito do danny silva. o danny silva nunca conseguiria libertar um país. a outra mesa olha com desdém.
23.30 - É hora da sobremesa. o conceito é fruta e chocolate.
23.55 - o indivíduo que não compareceu manda a justificação por sms. alegadamente estaria a mandar sete fodas naquele momento. aventou-se a hipótese de ser uma justificação falsa.
00.00 - o indivíduo que estava de prevenção faz uma festa porque é meia-noite e já não o podem chamar para o trabalho. ninguém lhe explica que os seus índices de sofreguidão eram alarmantes desde as 22.14.
00.12 - hora do digestivo. pedem-se whiskys. a empregada faz notar que o conceito a obriga a ter apenas famous grouse. mas que é envelhecido em cascos de carvalho e tudo. ficamos todos cheios de pena de não haver whisky envelhecido em cascos de outra coisa qualquer. de cavalo, por exemplo.
00.45 - num claro desafio ao conceito, pede-se mais uma rodada de digestivos. todos temos a boca a saber a carvalho.
01.48 - Singela homenagem ao maior futebolista de todos os tempos.
01.59 - Fala-se da vida e de tudo o que ela tem de bom, em ritmo forte.
03.00 - És boçal caralho, és boçal caralho.
- sou buçal o caralho é que sou buçal.
- o gajo não é bossal caralho, não vês que o gajo não é bossal?
- e se fosse, caralho?
nas festas da ilga chamam coisa lindas uns aos outros, chamam.
03.38 - entrada na discoteca. um indivíduo fica aparentemente nervoso, abre a carteira, mexe nos trocos, e depois entra, como todos.
03.46 - um indivíduo dança, de sorriso aberto, junto a um grupo de raparigas que pesam, em média, 70 kgs.
04.49 - Depois de assumir uma tonalidade algures entre o verde e o transparente, um indivíduo sai de cena. as suas últimas palavras:
"ná, vou-me embora caralho pá foda-se".
04.56 - um indivíduo dança, de sorriso aberto, junto a um grupo de raparigas que pesam, em média, 90 kgs. está consideravelmente mais transpirado.
05.23 - dança-se menos mas, em compensação, bebe-se um bocadinho mais.
06.00 - três indivíduos estão a apanhar ar à porta da discoteca. um ficou lá dentro a conversar sobre a geração maldita da poesia francesa e o outro a dançar ao pé de uma gaja com um maço de tabaco entalado numas mamas enormes.
07.06 - percurso a 4 até a um carro. falta um que lá ficou. tinha um fio de baba a pender do queixo e uma gorda ao lado.
07.42 - calhou-me ir sentado numa cadeira de segurança de um puto. ainda hoje me dói quando mijo.
07.45 - vou no meu carro, com um indivíduo a conduzir. sinto o rabo aliviado e adormeço num instante.
08.11 - acordo, nas portagens, com um indivíduo a abrir a carteira, mexer nos trocos e olhar para mim. pago a merda da portagem.
08.20 - cheguei a casa.
08.20 - adormeço.
08.54 - a minha mulher diz-me que a minha filha tem um dente a romper e que os gritos não são preocupantes.
08.56 - fico muito bem disposto quando me lembro que há um indivíduo que acordou pior que eu.
