27/03/10

mais do romance que aí vem

udolfo


boa noite, o meu romance já cria ruído. assim como recebi centenas de mensagens de encorajamento para a prossecução da novel obra, é verdade também que enfrentei a crítica, naturalmente em doses menores.
o meu método dinâmico de criação de personagens é complexo. o tamanho de um personagem é um micro-critério, um pormenor num procedimento holístico e exigente que me levou a anos de trabalho árduo com um processo de divórcio pelo meio. o acaso, aliado ao génio, trouxe para o meu futuro romance três personagens com o síndrome de anão, facto ao qual nem eu sequer tinha reparado. querem coisas realmente importantes? posso revelar que o grosso da narrativa se passa na suiça e no futuro. e que não abdico destas personagens lá por serem pequenas e acharem que eu estou a fazer pouco delas.
em portugal o saber sobre o síndrome de anão na arte e no desporto é escasso. as touradas estão marginalizadas e, na bola, é subutteo e pouco mais.
a tendência é soltarmos a ana drago que mora em todos nós e irmos para a rua gritar a defender os direitos dos mais pequenos, como se eles, só pelo tamanho diminuto, fossem diferentes ou não soubessem fazer manifestações sozinhos. consequentemente isto deriva numa pressão insustentável para qualquer talento emergente da literatura do burgo que decida pela inclusão de personagens estruturalmente mais baixos. esta luta rasteira tem origem nos círculos de filiados bloquistas, alastrando também aos grupos extremistas de defesa da natureza (meia dúzia de heloísas apolónias, essas cabras secas esganiçadas) e naquele paneleiro de brincos que passa a vida a colar cartazes contra o circo e a aparecer na televisão a vomitar ódio sobre o tipo de milho que ele entende  não ser tão bom para as pessoas.

o tambor, de gunther grass, continha uma banda itinerante de anões que entretinha as tropas. e matzerah, a personagem principal era, ele próprio, significativamente anão. o livro de grass tem muito mais anões que o meu. não consta que a badder meinhof (nt: bloco da minha esquerda, tradução do alemão) tenham ido chatear o gunther com merdas. qual era o problema?
um outro exemplo. dostoiévski escrevia com razoável mestria. um dos seus livros, o idiota, conta-nos a história do princípe myshkin, que era epiléctico. nenhuma associação de epilécticos molestou o fiódor. nem sequer associações de idiotas, que as há com fartura na rússia. mais, dostoiévski era, himself, epiléctico.

há uma forte possibilidade de eu próprio ter síndrome de anão, facto que deve fazer corar de vergonha e culpa os que agora me criticam. ficarão certamente com um desejo atroz de se auto-flagelarem com os enormes dildos rôxos gelatinosos que guardam na gaveta ao lado das fotografias de indivíduos africanos em pelota. apesar de não revelar a minha identidade, por motivos que se compreendem, hipotetisem que eu tenho esta condição de baixinho. a simples dúvida deverá ser para vós, que me criticastes, insuportável. e ficará para a história o acto fascista de tentar vetar a um possível anão o direito de escrever um livro sobre os seus.

olhem, o meu romance será seminal. e vocês, com os rabinhos todos escafandrados, perceberão finalmente que, independentemente do tamanho, sou mas é um grande humanista. e que a vossa malta, ao contrário de mim, só se lembra dos anões quando lhe dá jeito demagojar.